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Emílio Odebrecht

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Análise da Política Pública Antiracista – Lei 10.639/03 (sancionada como 11.645/08)


É fato que sem adotar uma segregação legal, a República Brasileira elegeu o princípio formal da “igualdade perante a lei” que foi incorporada à carta constitucional já em 1891. Como resultado dessa orquestração, pautado na ideologia dominante de embraquecimento, pouco foi feito no campo educacional para favorecer a população afro-brasileira, tanto no que diz respeito à legislação quanto à elaboração e implementação de políticas públicas, para a construção da dignidade da população negra e para o rompimento, via educação, de práticas racistas e discriminatórias.
A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, lei 4024 de 1961 determina “condenação a qualquer tratamento desigual por motivo de convicção filosófica, política ou religiosa, bem como quaisquer preconceitos de classe ou de raça”. Todavia, não prescreve um ensino de valorização da diversidade étnico-racial presente na sociedade, menos ainda orienta para a eliminação das desigualdades raciais que faziam da população negra a grande massa de crianças e jovens alijados dos sistemas de ensino e de adultos analfabetos.
O Estado assim, até a promulgação da Constituição Federal de 1988, fugiu ao dever de afirmar os direitos sociais tanto da população negra quanto das mulheres. A carta magna de 1988 é percebida, por muitos, como um avanço para a democracia. No que concerne à possibilidade de emancipação dos negros e das mulheres, ela estabelece como um de seus objetivos “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (Art. 30, inciso IV).
O referido artigo, se considerada a realidade educacional, permitiria que a União, representada pelo Ministério da Educação – MEC - cuidasse de construir no interior de sua estrutura, bem como nos sistemas de ensino do país, políticas articuladas sob o eixo do combate ao racismo e seus derivados, com vistas à materialização de um sistema nacional de educação que, de fato, cumprisse o objetivo constitucional acima citado.
Contudo, o disposto na Constituição Federal não levou os sistemas de educação a formular programas e políticas públicas específicas e reparatórias à situação da população negra e das mulheres que secularmente vivem alijadas do direito básico a uma educação de qualidade.
É importante considerarmos que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB, Nº 9394/96, representa o principal elemento qualitativo da transição institucional da educação brasileira. Ela permitiu a redefinição de papéis e responsabilidades dos sistemas de ensino, concedendo maior autonomia à escola, flexibilizando os conteúdos curriculares e estimulando a qualificação do magistério.
Contudo, não foi o seu texto original que precisou a configuração de uma educação de cunho anti-racista e anti-discriminatório. Apenas 15 anos depois, quando foi alterada pela Lei Federal Nº 10.639, de janeiro de 2003, tornou obrigatória a inclusão, no currículo das escolas de ensino fundamental e médio (públicas e privadas), o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, e também instituiu o dia “20 de novembro” como uma data comemorativa no calendário escolar.
É evidente que a referida política pública abriu as portas da educação para o processo de resgate da história e cultura afro-brasileira. É um ponto positivo para o processo de reconhecimento da sociedade como nação da diversidade e possível “fim” da discriminação étnica.
No entanto, sua implementação apresenta falhas. A lei 10.639/03 traz em seu texto a obrigatoriedade para se trabalhar a história e cultura afro-brasileira nas escolas, mas não trata da capacitação dos profissionais envolvidos para atender a este fim e deixa brechas quanto ao seu estudo nas faculdades de educação ou outras faculdades que lidam direta ou indiretamente com a educação.
Existe, ainda, resistência do corpo educacional quanto às relações negras (cultura, religião principalmente, história). Essa resistência é dada justamente pelo desconhecimento da história e da origem da cultura brasileira enquanto advinda da cultura africana. Deve-se fazer um trabalho etnocêntrico junto ao corpo educacional para que haja a aceitação da valorização afro-brasileira para, enfim, eliminar a resistência quanto ao tema e conseguir uma efetiva implementação da lei 10.639/03.
A partir daí, teríamos o início de um trabalho realmente eficaz para o resgate da história e cultura brasileira e a posterior eliminação da discriminação racial. Mas isto é projeto de longuíssimo prazo.

Por Juliana Souza- Cientista Política

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